"Estamos reinventando o futuro, somos fragmentos do futuro em gestação, e o que mais nós necessitamos é de um público co-produtor, partícipe da cena, que leve para casa as idéias que o Teatro sempre soube tão bem insuflar nos espíritos educados para que estes possam contribuir para as transformações necessárias que nossa sociedade tem urgência de ver realizadas"

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

PRÓLOGO SEGUNDO CHICO, O PERSONAGEM


O que se fala do tal de Cara-Preta dá pano pra manga que só o diabo. Uns dizem que ele foi um sanguinário, um desordeiro, analfabeto, bandido, salteador, cangaceiro, assassino, infame e daí pra pior. Outros já falam que Raimundo Gomes, o Cara-Preta, era um libertário, revolucionário, justiceiro e até messias dos escravos. O certo é que não importa o que ele seja aqui no presente, nada vai mudar o que de fato ele foi, lá no passado. Pois para discorrer sobre o ocorrido e escorrido incidente, só existem duas alternativas para nós que não estávamos, por acaso, dando uma volta no Maranhão, em 1838: a história do vencedor e a história do perdedor. E nenhuma das duas pode apurar o fato em sua milimétrica fidelidade, pois, o que temos aqui é apenas a história e as suas interpretações, que podem até serem bem acertadas, ou, como diz o doutor, ‘fidedignas’, mas, mesmo que chegue no detalhe da ruga presente no detalhe da fuça, a história será, e sempre será, história, pois se a história fosse sempre verdade, não carecia de ser chamada de história, e sim, de verdade e ponto final.

            Mas antes que tudo comece, é necessário esclarecer uma só coisinha que me apoquenta o juízo: quem ganhou ficou no poder e, já estando por lá, chegou da guerra falando só na vitória, que venceu, que estava certo e mais um milhão de coisas; mas e quem perdeu? Quem perdeu não teve vida nem chance de contar o acontecido tim tim por tim tim, detalhe por detalhe, esclarecendo parte por parte do sucedido. Então, o que se sabe, até o presente momento, só é uma versão (a do vencedor da batalha) e ainda falta metade do livro para terminar de vez a leitura. Mas este equilíbrio entre as duas versões não é possível, pois já seria demais pedir ao vencedor que dê a mão pro vencido, e ao vencido que aceite o alento do vencedor, pondo pontos nos is e conferindo a cada um sua merecida importância. Se fosse desse jeito, guerra virava amizade, e quem nos dera que fosse nosso mundo assim!
            No entanto, aqui nos cabe escrever a parte que não foi escrita, ou – longe de mim levantar suspeitas – apagada. Mas não estou aqui para espalhar boatos e já falei mais do que nêga do leite. O que vai se passar nesta peça tem tiro, sangue e brutalidade. No entanto, a voz que vai ser falada e a lágrima que vai ser chorada são as do outro lado, aquele que ficou adormecido no tempo, e sobre o qual, a história passou por cima, olhando apenas por detrás do ombro, como quem olha de passagem. Portanto, como verossimilhança, pra mim, é conversa muito da torta e a história pro teatro é pouco e a verdade pro palco é demais, vamos escolher aqui o meio termo, pra não queimar os miolos: Apresentamos aqui uma história verdadeira, só que fictícia, ou melhor, uma história ficcionalmente verdadeira! A história dos Caras-Pretas!
                                                                                                                                       Igor Nascimento


Texto que faz parte do programa do espetáculo Negro Cosme em Movimento. O Grupo Cena Aberta apresentou no dia 05 de outubro de 2013, às 17:00 hs, na Pç.Nauro Machado - Praia Grande, fazendo parte da 7ª. FELIS - Feira de Livro de São Luís. Sendo patrono da mesma o poeta Nauro Machado. 

























FOTOS: Paulo Socha

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